sexta-feira, 4 de maio de 2012

Justa acusação para uma justa defesa


Disponível também em fredericocattani.com.br.


Por Frederico Cattani *

O direito processual penal não deveria ser um redutor de complexidade; muito além de um processo kafkaniano, no qual o acusado sofre a inquisição por um sistema que não suporta a realidade em que atua. Processos estes que surgem em construções sem alicerces, do que seria uma calúnia, pois antes do Estado acusar, julga, na espera que aquele que leva sua etiqueta, seu número processual, defenda-se e demonstre que nada teme ou deve. O processo penal deve seguir suas regras, norteadas pelos limites constitucionais. 

A realidade em evidência em cada processo foge àquele que ele narra, mas prende-se ao ambiente sobre aquele em que o processo se movimenta, em cubículos saturados de autos, de julgamentos autofágicos, que se alimentam de jurisprudências que o mesmo processo passará a ser. Rituais estes que pouco enobrecem os envolvidos, mesmo que muitas vezes dêem certo destaque aqueles que atuam. Ao acusado cabe ser mero coadjuvante. Esmera-se a Justiça em desculpar seus meios para não ter que justificar seus fins, com uma fé em que, certo seria, para quem corre um processo, algo há. 

Maior atenção aos crimes societários. Universo multifacetado de difícil análise sobre os fatos em concreto. A dificuldade justificaria um redutor de complexidade. Nunca. O Direito não pode ser um redutor da complexidade. Neste tocante, ao reduzir a complexidade, institutos como o da dúvida a favor do réu de nada bastariam, pois poucas palavras, sem quaisquer bases, servem para condenar. Por isso, em crimes societários, ao se falar em individualização de condutas, está-se desprendendo de um entendimento simplório e arraigado em uma suposta e tácita solidariedade de riscos entre os sócios. O que não existe. Não se podem justificar meios de não individualização de condutas, resgatando a complexidade em desculpa, quando a complexidade faz parte do processo, da vida, do acusado e de quem acusa, – julga – se defende. Inconcebível uma investigação que não investigue, quando se espera, em uma denúncia, que seja demonstrado o mínimo, uma possível culpabilidade de cada sócio, inclusive por ser a pena uma dor àquele que agiu, sendo pré-histórica a penalização que vai além da figura do culpado.

O processo penal desvairado, inquirindo às cegas para desprender a complexidade investida ao Estado para acusar, inverte papéis, kafkanianamente, obrigando réus a provarem inocência sem qualquer estrutura acusatória. Expectativas para formação de um juízo se perdem em um senso comum; distancia-se do direito e aproxima-se de um circo.

 Advogado
Mestre em Ciências Criminais - PUCRS
Especialista em Direito Empresarial - FSG / RS
Professor de Direito Penal e Empresarial da Estácio de Sá - FIB
Membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - IBCCRIM
Coordenador do grupo de Estudos em Crimes Econômicos - Elucubrações Penal